
Medida adotada é uma das estratégias mais antigas do mundo e é o que anda garantido o suprimento de água em Poconé. Comunidade do Pantanal recorre a estratégia simples para enfrentar períodos de seca
Após enfrentarem o segundo ano mais seco da história, moradores de Poconé (a 104 km de Cuiabá) encontraram uma solução tradicional, porém eficaz, para enfrentar a crise hídrica no Pantanal: construíram uma cisterna para armazenar água da chuva e garantir o abastecimento durante os longos períodos de estiagem.
A iniciativa, apoiada pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e pelo Sesc Pantanal, tem sido essencial para manter o sustento das famílias e preservar a biodiversidade da região mais alagada do mundo.
Segundo a artesã Rita de Cássia Lemes de Oliveira, não dava apenas para seguir assistindo as coisas piorarem e viver com o risco da falta de água.
“Nós trabalhamos, confeccionamos os animais do Pantanal, a gente tenta retratar toda a fauna e a flora do nosso Pantanal, que é a maior riqueza que nós temos aqui. A água é vida, é essencial para gerar toda essa diversidade que nós temos aqui no Pantanal”, disse.
A cisterna tem capacidade para armazenar 17 mil litros de água e pode abastecer uma família de quatro pessoas por cerca de 30 dias
Reprodução/TVCA
Como qualquer bioma, o Pantanal passa por períodos de seca. O problema é que, sendo a maior planície inundável do mundo, ele tem secado além do esperado, impactando diretamente a vida dos moradores da região, incluindo os animais. A artesã Rita é um exemplo disso e lamenta a escassez de recursos.
“O período de seca é muita tristeza, fica muito seco e a gente fica assim com dó dos animais, dos bichos daqui. Esses bichos de pequeno porte, como as aves, a gente tem que colocar água para eles na vasilha”, contou.
A água armazenada deve ser usada para as atividades que geram renda para as famílias, como o viveiro de mudas nativas para reflorestamento
Reprodução/TVCA
De acordo com o doutor em Recursos Hídricos da UFMT, Ibraim Fantin, nos últimos anos, o Pantanal tem enfrentado mudanças preocupantes no ciclo natural de secas e cheias. Ele alertou que a redução do período chuvoso e o prolongamento das estiagens têm afetado não apenas o equilíbrio ecológico da região, mas também a qualidade de vida das comunidades que dependem dos recursos naturais para sobreviver.
“Nos últimos cinco anos, o Pantanal passou por um período de escassez hídrica bem severo. Inclusive no ano de 2024, ele foi caracterizado como a pior seca já registrada no Pantanal. Então,a tendência das variações climáticas do Pantanal é que o período chuvoso é mais curto e o período de seca é mais prolongado. Isso tem uma série de consequências não só no funcionamento ecossistêmico, mas também dos serviços ambientais que a natureza presta para o homem”, explicou.
A cisterna foi uma medida adotada pelos moradores para evitar a escassez de recursos durante períodos de estiagem
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Segundo Ibraim, o reservatório garante o abastecimento de água na região durante o prolongamento das estiagens.
“Nós precisamos trazer mecanismos, instrumentos, não só para deixar o uso da água mais eficiente, a gente sabe cuidar melhor da água, mas também poder armazenar e tratá-la com bastante carinho para que ela perdure por todo o período de escassez”, pontuou.
A cisterna tem capacidade para armazenar 17 mil litros de água, volume suficiente para abastecer uma família de quatro pessoas por cerca de 30 dias. O custo, em torno de R$ 3 mil, é considerado baixo diante dos benefícios. A construção contou com a mão de obra da própria comunidade, além de vizinhos que participaram para aprender a técnica.
O analista de programas sociais, Michel Santos Lima, informou que, para realizar a construção, os moradores participaram de cursos e palestras que ensinaram a melhor forma para armazenar água.
“Houve curso, palestra, oficina, enfim, todo conhecimento válido para que a pessoa tivesse autonomia para construir essa cisterna. Eles têm autonomia, tanto para replicar na casa deles, como também ensinar outras pessoas a fazerem. É uma tecnologia social de baixo custo e acessível a todos”, ressaltou.
A água armazenada deve ser usada para as atividades que geram renda para as famílias, como um viveiro de mudas nativas para reflorestamento e para irrigar os pés de açaí, banana e açafrão para o consumo dos moradores.
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