Paciente em surto que fez enfermeira refém foi atingido por tiro no abdômen porque se curvou, afirma comandante da polícia


Comandante da Polícia Militar de Morrinhos disse que o policial que efetuou os disparos tinha intenção de acertá-lo nas pernas. A Polícia Civil afirma que aguarda a perícia e o laudo cadavérico. Paciente em surto é morto após fazer enfermeira de refém em UTI
O paciente em surto que fez enfermeira refém foi atingido por tiros no abdômen porque se curvou, segundo o comandante do 36º Batalhão da Polícia Militar de Morrinhos, tenente-coronel Werik Ramos. Ele disse que o policial que efetuou os disparos tinha intenção de acertá-lo nas pernas, para imobilizar, mas o paciente se moveu durante a ação e o tiro acabou perfurando o abdômen.
“O policial tentou, inclusive, realizar o disparo nos membros inferiores do indivíduo, nas pernas dele, mas ele se encurvou no momento do disparo. Então, atingiu a região lateral do abdômen”, disse ele em entrevista à TV Anhanguera.
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Ainda segundo o comandante, o momento do disparo foi marcado pela tentativa da vítima de se desvencilhar do paciente que a segurava. Um vídeo mostra o momento em que, ameaçada com um pedaço de vidro, a profissional da saúde consegue afastar o braço do paciente, que foi baleado logo depois, e escapar (veja acima).
“Na hora que a vítima tentou se desvencilhar dele, o paciente foi para cima dela, que caiu. Ele foi pegar ela no chão e se encurvou, foi justamente a hora em que o policial agiu, aí pegou no abdômen dele”, disse o comandante ao g1. Segundo ele, o policial tentava estabilizar uma “situação caótica” e apenas cumpriu um procedimento padrão.
Já o delegado do caso, Fabiano Jacomeli, disse ao g1 que a Polícia Civil não deve focar na intenção do policial, e aguarda a perícia para investigação. O laudo cadavérico também deve confirmar a causa da morte e o local exato onde o paciente foi atingido. Segundo o delegado, testemunhas já foram ouvidas.
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O paciente, Luiz Cláudio Dias, de 59 anos, estava internado há três dias em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Municipal de Morrinhos, no sul do estado, onde fazia tratamento renal. O caso aconteceu no último sábado (18). Após ser baleado, ele chegou a receber atendimento médico, mas não resistiu aos ferimentos e morreu.
Em nota, a Polícia Militar (PM) afirmou que protocolos de gerenciamento de crises foram aplicados para tentar liberar a enfermeira, mas que, mesmo diante das tentativas, foi necessária a realização de um disparo contra o paciente para resguardar a vida da refém. Afirmou ainda que um procedimento administrativo foi instaurado para apurar os fatos (leia na íntegra ao final do texto).
Em nota divulgada após o fato, a Prefeitura de Morrinhos afirmou que lamenta profundamente o ocorrido e que está à disposição para esclarecer os fatos.
O que diz a família?
A família de Luiz Cláudio Dias afirmou em carta pública que ele foi executado de forma cruel e questiona a conduta dos militares e da equipe de saúde (leia na íntegra ao final do texto). A carta pontua que ele estava fisicamente enfraquecido, mas foi rendido e imobilizado.
“Mesmo nessas condições, foi pisoteado e executado à queima-roupa por dois policiais, de forma desproporcional, cruel e absolutamente inadmissível. A conduta esperada da equipe de saúde e da força policial era outra: técnica, responsável, humana e proporcional à situação, o que poderia ter evitado essa tragédia”, diz a carta.
Desejo de justiça
Filho de paciente morto em UTI manifesta luto nas redes sociais, Goiás
Reprodução/Redes Sociais
Nas redes sociais, o dentista Luiz Henrique Dias, filho de Luiz Cláudio, postou um vídeo em frente ao Instituto Médico Legal (IML), enquanto esperava pela liberação do corpo do pai. Ele se diz revoltado com a situação e que soube da morte do por vídeos que circularam entre os moradores do município.
“Eu fiquei sabendo que meu pai morreu antes mesmo da equipe médica me falar. Que despreparo desse povo. A dor é grande, mas Deus vai fazer justiça. A polícia matou meu pai dentro de uma UTI, um paciente com hipoglicemia, com menos de 60 kg, fragilizado” desabafou o dentista no vídeo.
O funeral de Luiz Cláudio ocorreu na manhã de domingo (19). Ele foi sepultado às 19h.
Surto em hospital
Enfermeira é feita de refém durante surto psicótico de paciente em UTI de Morrinhos, Goiás
Reprodução/Redes Sociais
Segundo a PM, Luiz Cláudio estava em um surto psicótico quando fez a enfermeira de refém e a ameaçou com um pedaço de vidro quebrado. Em entrevista ao g1, o prefeito de Morrinhos, Maycllyn Carreiro (PL), afirmou que Luiz Claudio não tinha histórico de surtos psicóticos. O prefeito disse ainda que casos de surtos durante a internação em uma UTI não são incomuns.
“Não é incomum pacientes terem delírios e, às vezes, surtos, durante os tratamentos na UTI. Só que, esse fato, foi totalmente atípico. Ele [Luiz] se levantou do leito onde estava internado, arrancando os equipamentos e falando de forma totalmente desconexa, correu para o banheiro, quebrou o vidro, pegou a enfermeira, que estava saindo do banheiro feminino, a engravatou e colocou o vidro no pescoço dela”, contou o prefeito.
Ainda segundo Maycllyn, os outros membros da equipe médica tentaram dialogar com Luiz Cláudio, mas sem sucesso. Como não conseguiram reverter a situação, os funcionários do hospital acionaram a PM.
Carta da família na íntegra
“A família de Luiz Cláudio Dias vem a público, por meio desta nota, pedir à imprensa que trate o caso com o máximo de responsabilidade, ética e empatia, evitando títulos sensacionalistas que possam distorcer os fatos ou agravar ainda mais a dor de quem já enfrenta um momento de luto profundo. É essencial que o trabalho de informar a sociedade seja conduzido com compromisso com a verdade, respeito ao contexto e sensibilidade, considerando que o ocorrido representa não apenas uma tragédia pessoal, mas também uma grave falha institucional.
Luiz Cláudio, de 59 anos, era um paciente renal crônico, diabético, debilitado por pneumonia e internado na UTI de Morrinhos/GO em estado de extrema fragilidade.
Em um momento de surto hipoglicêmico, ele ameaçou uma enfermeira com um caco de vidro. A família lamenta profundamente o medo vivido pela profissional de saúde e manifesta sua solidariedade, reafirmando que nenhum trabalhador deveria passar por situações que coloquem em risco sua segurança.
Entretanto, é imprescindível contextualizar os fatos de maneira justa e equilibrada. Luiz Cláudio, fisicamente enfraquecido, foi rendido e imobilizado. Mesmo nessas condições, foi pisoteado e executado à queima-roupa por dois policiais, de forma desproporcional, cruel e absolutamente inadmissível. A conduta esperada da equipe de saúde e da força policial era outra: técnica, responsável, humana e proporcional à situação, o que poderia ter evitado essa tragédia.
A família reforça que buscará por justiça, para que os responsáveis por essa violência brutal sejam responsabilizados e para que o caso se torne um marco na reflexão sobre as falhas do poder público em lidar com situações de crise envolvendo pessoas vulneráveis.
Não apenas Luiz Cláudio foi negligenciado; a segurança da enfermeira e de todos os envolvidos também foi colocada em risco por ações e omissões que demonstram imprudência, negligência e imperícia do Estado.
A imprensa desempenha um papel indispensável na construção de uma sociedade mais justa e informada. Por isso, pedimos que a cobertura desse caso seja feita com ética e comprometimento, sem sensacionalismo, e que a memória de Luiz Cláudio não seja reduzida a um estigma ou a uma narrativa incompleta. Ele era uma pessoa com história, família, e uma vida marcada pela luta contra problemas de saúde severos.
Por fim, a família agradece às pessoas que têm demonstrado solidariedade nesse momento de dor e clama por respeito à memória de Luiz Cláudio e ao nosso luto. Que essa tragédia sirva para promover mudanças que evitem novas vidas perdidas pela falta de preparo e humanidade nas respostas do Estado.
Família de Luiz Cláudio Dias
19 de Janeiro de 2025.”
Nota da Polícia Militar na íntegra
“A Polícia Militar de Goiás informa que, na noite de sábado (18), uma equipe do 36º Batalhão da Polícia Militar atendeu uma ocorrência no Hospital Municipal de Morrinhos, onde um paciente, em surto psicótico, manteve uma técnica de enfermagem refém na UTI, ameaçando-a com um objeto perfurocortante (pedaço de vidro).
Após a chegada dos policiais, foram iniciados protocolos de gerenciamento de crises para liberar a vítima. Apesar das tentativas de verbalização para que o autor liberasse a vítima, ele permaneceu em atitude agressiva e reiterou as ameaças.
Diante do risco iminente a vítima, foi necessário a realização de um disparo de arma de fogo para neutralizar a agressão e resguardar a integridade física da refém.
Mesmo alvejado, o autor continuou resistindo, sendo necessária a sua contenção pelos demais policiais militares. A equipe médica prestou socorro imediato, mas infelizmente ele não resistiu aos ferimentos e veio a óbito.
A ocorrência foi acompanhada pelo delegado plantonista, que conduzirá as investigações cabíveis.
A corporação informa que foi instaurado um Inquérito Policial Militar (IPM) para apurar detalhadamente as circunstâncias da ocorrência, assegurando transparência e o cumprimento dos procedimentos legais.”
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